Uma saída pra nós dois

Não chega devagar porque entre a gente impera a pressa. Me dá aquele sorriso de dentes grandes e sacia tua fome sem medo. Me devora pelas beiradas primeiro – uma mão guiando minha nuca, embaraçada entre os cabelos, a outra brincando em minha coxa de enterrar os dedos. Se perde dentro de mim. Invade meu pescoço com um suspiro desavisado e observa meu tato e olfato duelarem pelo teu hálito – o sopro dele eu já conheço. Esquece tua língua na minha boca, e meus lábios se moverão no desenho da interrogação de como teu gosto pode ser tão bom assim – mas você não vai ouvir. Em vez disso, vou te exclamar pedidos sutis: posiciona meu corpo contra a parede e abocanha minha carne entre os dedos. Degusta a textura do meu cheiro, enxerga a temperatura do meu sabor e sente o torpor da minha sinestesia. Funde tuas sensações às minhas com maestria. Me joga no teu labirinto de desejos – a essa altura, eu já estarei sem saída.

Entra pela porta do quarto enquanto eu arranco tua camisa. Ela irá descansar branca nos pés da cama, enquanto meus pés se aninham em teu pescoço. Desce mais um pouco. Deixa eu tirar a corrente de ouro que cai sobre teu peito, porque o toque dela na minha pele é frio, e o da minha na tua é combustão. Observa que entre esse crepitar há sussurro cantado por cada poro. Para – me deixa guiar. Sacia meus sentidos – meus olhos gostam de ver os teus se fechando quando os músculos de tua testa dançam feito chamas em movimentos involuntários. Meus ouvidos estão famintos pelos nomes que me chama sempre que tua cabeça desenha um sinal em negativa e se contorce para trás. Perde o fôlego. Pede o ritmo. Entrelaça teus dedos abaixo do meu queixo enquanto eu te conduzo pelas vielas do meu corpo. Morde o canto inferior do lábio enquanto eu te contorno e te enclausuro. Se rende ao meu cárcere – a essa altura, você já estará sem saída.

Me estende os braços feito lençol limpo e aceita eu te fazer travesseiro. Deixa eu te sentir de outro jeito – vou subir e descer em cima do teu peito enquanto desacelera tua respiração. Planta teu cheiro na roupa de cama – ele também eu já conheço. Vou afogar meus dedos em teu mar de cabelos negros enquanto os teus dedilham as minhas costas. Faz ecoar tua risada desajeitada a cada vez que me escapar um calafrio. Me toca com um comentário literário, me lambe com teu sarcasmo, e eu vou encontrar a resposta de por que teu gosto é tão bom assim – mas você não vai ouvir. Em vez disso, vou sugerir mais um banho de chuveiro. E, ainda debaixo d’água, meu corpo irá te convidar para mais um banho de suor. Não se preocupe, pode se demorar mais um pouco. Nós dois somos passarinhos com medo de pouso, mas não faz mal se aconchegar por hoje em meu ninho. Não precisa temer quando eu me roçar debaixo de tua asa e cantar baixinho. O dia tá nascendo, e quem sabe ainda dê tempo de voar de novo pelo céu da minha boca. Quando o sol lá fora ganhar altura, eu te mostro a saída.

Não se esquece da corrente de ouro em cima da mesa, ou irá te fazer falta. E do teu perfume na roupa de cama, ou a falta será minha.

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